domingo, 8 de novembro de 2009

Abandonada na areia



Encontrei-a abandonada na areia
Murcha já quase sem vida
Foi arrastada pelo mar, pelas ondas
Coberta de areia e sal, perdida

Alguém a ofereceu com amor
No entanto foi assim acabar desprezada
Um coração partido, dor e sofrimento
Algo que partilho nesta hora de tormento

terça-feira, 13 de outubro de 2009

Morte e ressurreição

Já faz algum tempo que estava a prever um temporal para o meu lado. Sentia que o tempo não augurava nada de bom, a iminência da catástrofe sufocava-me, não a via, não fazia a mínima ideia se seria um terramoto, um furacão, inundações... não tinha a mais pequena ideia do que vinha aí, mas sentia que era algo terrível. Os temporais que me assolavam não eram mais do que um sinistro prenuncio de que algo verdadeiramente catastrófico estava para acontecer.

Hoje os meus receios e temores mais negros foram materializados, foi como se tivesse sido atingido por um tsunami gigante. Morri, morri mesmo, um cadáver conduzia aquela Strakar, a minha alma não habitava o meu corpo, tinha sido de lá arrancada pelo tsunami devastador, levada para a Antárctida onde ficou aprisionada sob um imenso glaciar...

De repente uma onda engole-me e lança-me a toda a velocidade num surf sem prancha directo à praia. Senti o fluir da água em torno de mim e a premente vontade de voltar a respirar; senti a areia a friccionar o corpo, travando a velocidade até à completa imobilização; a água recua deixando-me finalmente respirar. Foi algo contrariado que permiti que uma golfada de ar voltasse a invadir-me os pulmões. Expirei, levantei a cabeça e desatei a rir, ri profundamente e as minhas gargalhadas fizeram levantar as gaivotas que se preparavam para dormir ali por perto.

Olhei à minha volta, estava completamente nu deitado na areia enquanto as ondas vinham acariciar-me o corpo, levantei-me estava quase só, ao longe na névoa da maresia apenas se vislumbravam os vultos de algumas pessoas que passeavam pela praia. Voltei a correr para a água, repeti o longo surf, no fim do qual soltava um grito de prazer retornando para o mar que novo me trazia para terra.

Depois de dezenas de investidas voltei para a areia, exausto, distingui com dificuldade a minha roupa abandonada no areal, sentei-me ao lado dela e contemplei o pôr do sol, entrei em meditação e ali fiquei até o sol desaparecer por completo no horizonte, vejo o telemóvel a se assomar num bolso das calças e ponho a tocar aleatoriamente. Primeiro um jazz por Diana Krall - Almost Blue, seguiu-se The Blue de David Gilmour e quando as primeiras estrelas começaram a ficar visíveis Island também de David Gilmour.

Remeber that night
White steps in the moonlight
They walked here too
Through empty playground,this ghosts' town
Children again, on rusting swings getting higher
Sharing a dream, on an island, it felt right

We lay side by side
Between the Moon and the Tide
Mapping the stars for a while

Let the night surround you
We're half way to the stars
Ebb and flow
Let it go
Feel her warmth beside you

Remember that night
The warmth and the laughter
Candles burned
Through the church was deserted
At dawn we went down throgh empty streets to the harbour
Dreamers may leave, but they're here ever after

Levantei-me, sacudi o melhor que consegui a areia do corpo antes de me vestir e procurei o carro, coloquei a chave na ignição e o CD começou a tocar Diana Krall - Every time we say goodbye, I die a little. Recostei-me no banco e fiquei ali a contemplar um céu cor de laranja. Respirei fundo, os versos de On an Island atravessavam-me o pensamento misturando-se com aquilo que ouvia nesse momento e pensei em tudo o que me tinha acontecido.

Tinha morrido e voltado a nascer.

sábado, 11 de julho de 2009

AZUL

Fecho os meus olhos
Cheios de estrelas
Cheios de luz
AZUL

A água molha-me a pele
Encho os pulmões
Afundo-me no
AZUL
No meio dos destroços do vapor
Um polvo contempla-me
Vou flutuando no
AZUL

No fundo do mar mil cores
Milhões de tonalidades
Vermelho, verde e
AZUL
Nas cavernas daquele navio
Muitas dores passaram
Mas lá ao fundo é
AZUL

Vejo esponjas e gorgónias
Polvos, sargos e fanecas
Mas espanta-me o
AZUL

Na escuridão da profunda gruta
Seres estranhos passeiam
Também eles procuram
AZUL

Lá fora vejo a glória da luz
Uma profunda e intensa
Mas suave no tom
AZUL



O sol aquece-me a alma
Banha-me o corpo
Sob um céu
AZUL

O barco flutua placidamente
Espera-me sem pressa
Sobre o oceano
AZUL

domingo, 21 de junho de 2009

Que dia...


Lembro-me do azul
Um azul profundo, luminoso
Onde a vista se perdia
Achando-se nos corais

Nadei na mansidão da corrente
Livre das grilhetas da gravidade
Pairei sobre rochas, sobre areia
Na ternura da imponderabilidade




Lembro-me do crepúsculo
Da doçura da água
Que me acolhe no seu seio
Que me abraça suavemente

As medusas soltam os tentáculos
Como cabelos sacudidos no vento
Ondeiam ao sabor da corrente
Despenteados, belos, livres



Lembro-me da escuridão
Sem a luz do dia
Sem a luz da lanterna
Outra luz surge

Milhares de estrelas brilham
Como uma via láctea
No fundo do Oceano
O esplendor galáctico




Lembro-me de 2 olhos fitarem-me
Interrogavam quem anda aí
Quem ousa perturbar a Paz
Quem trouxe essa luz

Sinto-me intruso naquele mundo
Sinto-me um estranho na terra
Quero viver aqui
Embora em breve deva partir




Lembro-me daquele dia
Da imensa paz
Do sublime pôr-do-sol
Da serena noite

No nevoeiro da memória
Persiste aquele dia que passou
Como gravado numa rocha
Como desenhado no vento

segunda-feira, 15 de junho de 2009

Proa do River

música: Sweet, Sweet Rain - Gene Loves Jezebel


Chove, Chove torrencialmente
O cheiro doce da terra molhada
O som forte e grave do trovão
Um relâmpago, uma luz rasgada

O mar estende-se à minha frente
Sinto o sabor salgado da maresia
O Doce e o salgado se misturam
O verde e o azul se completam






Desço lento ao fundo do mar
Percorro a longa galeria despida
Por entre ferros, tubos e manilhas
Surge de repente o brilho da vida

Em silencio contemplo o escuro
As sombrias entranhas da nave
Outrora sulcou majestosa as ondas
Hoje no fundo jaz inerte e grave




O caos é a origem do cosmos
A destruição é o berço da vida
Rodando eternamente
O universo é uma espiral infinita

À luz segue a sombra
À vida segue a morte
Inexorável o tempo passa
Mas repete-se sempre diferente





Sinto urgência por esperar
Mas porque espero? O que espero?
Talvez espero por esperar
Ou então apenas um desespero

Sinto o mar correr nas veias
Sinto o vento por baixo da pele
No meu coração batem as ondas
Nos meus olhos brilham estrelas



Recordo cada beijo que dei
Cada mulher que AMEI
Cada ternura dada e recebida
Cada lágrima de dor vertida

Sinto-me amarrado a mim mesmo
Preso num corpo que é meu
Sou estrangeiro em minha casa
Sou nativo entre estranhos

sábado, 30 de maio de 2009

De novo no River

música: Why does my heart feel so bad? - Moby

Envolto numa névoa azul
Preso numa cadeia de coral
Jaz imóvel, imperturbável
Olhando-o não parece real




No meio de ferros retorcidos
A vida prossegue, imparável
No meio do horror e da morte
A beleza mantém-se indelével




Mergulho nas suas cavernas
Passo pelas suas estruturas
Algumas apertadas e estreitas
Outras largas como ruas






Um grande sargo passeia
Belo, listado, brilhante
Nas suas escamas bate a luz
O seu brilho parece um diamante






De escamas vermelhas
passeiam-se pelos fundos
Aqui estão bem melhor
Longe de lugares imundos






Por aqui já muitos rostos olharam
Já foi uma janela para o mundo
Lá dentro está um escuro de breu
E de lá um fantasma olha o fundo

sexta-feira, 1 de maio de 2009

Regresso ao paraíso

música: Return to Paradise - Elton John

Regressei ao paraíso
Um turbilhão de emoções invade-me
Sou recebido com um tapete vermelho
Sinto-me pequeno, muito pequeno.


Pequeno como aquele pepino
Aninhado entre as algas vermelhas
Pequeno no meio do esplendor
Num mar agitado, esverdeado.


O meu coração bate calmamente
A paz invade-me docemente
A música agora é a respiração
A som das ondas ficou para trás.

Saí do mundo das trevas para a luz
Trevas claras, luz escura
Da escuridão da claridade
Para a luz da profundidade


Sou rodeado por Ninfas e Sereias
Elas bailam à minha volta
Vou brincando, dançando, rodopiando
Num êxtase de alegria e felicidade.



Deixei para trás a gravidade
Voltei de braços abertos
A esse mundo sem peso
Ao mundo da imponderabilidade.



Passei pelo túnel estreito da razão
Atravessei as águas do mar
Rumo ao fundo, rumo à luz
Rumo à vida, à emoção.



Brinco com os chocos, com os polvos
Brinco com as lulas e as solhas
Continuo a brincar, com as conchas
Com raias, safios e moreias.



Persigo tainhas e robalos
Faço corridas com sargos
Jogo às escondidas com bodiões e judias
corro com as salemas e as enguias.


A brincadeira pára agora
O computador apita, é hora de regressar
Com melancolia me despeço do mar
É tempo de voltar para ao ar.

domingo, 15 de março de 2009

Feel...

música: Feel - Robin Williams

Sinto-me no paraíso! Estou no fundo do mar embalado pela corrente, deslumbrado com a explosão de cores à minha volta. Apesar da visibilidade não ser grande coisa, a fauna e a flora deslumbra com uma variedade de cores que nunca tinha visto.

Diria que a Primavera também chegou ao reino de Neptuno, um Bodião fluorescente cruza o meu caminho, nunca tinha visto nenhum assim com a cauda e diversas manchas de um azul eléctrico fluorescente.

A atmosfera que me rodeia parece irreal, parece um sonho.

Sigo-o pelas grutas submarinas até encontrar uma judia que mais parecia um arco-iris.

Será que morri e estou no paraíso? As bolhas de ar de saem do regulador dizem-me que estou bem vivo.

Para onde quer que olhe uma orgia de cores invade-me a vista e atesta-me a alma. Uma paz profunda preenche-me o corpo, só me apetece ficar ali a usufruir daquele espectáculo de luz e cor.

Um cardume de salemas empresta o seu brilho prateado, envolvendo-me num caleidoscópio de reflexos.

Pergunto o que se passa, as salemas dizem-me que chegou a Primavera e todos os seres subaquáticos comemoram.

- Lá em cima não têm também a Primavera? - perguntam-me.

Respondo que sim, que também é uma explosão de cores e cheiros, mas não esperava encontrar o mesmo quadro cá em baixo.

Um minúsculo caboz está poisado num fundo vermelho e rosa quase se confundindo com ele. Observa-me calmamente, olho-o durante alguns segundos e deixo-me contagiar pela sua serenidade.

Poucas vezes senti-me tão rodeado de beleza e cor, apenas quando mergulho sinto-me assim tão em paz. Uma pergunta percorre-me o espírito, para quê tanta disputa e tanta intriga?

Aqui o poder deixa de fazer sentido, para que serve acumular riqueza se não se poder usufruir desta paz, deste bem-estar?
Que prazer me dá ver o meu nome na Phorbes, e não ter tempo para apreciar a vida, para que me serve ganhar milhões que nunca poderei gastar. Para quê gastar uma vida a acumular riqueza e poder e não desfrutar da beleza do mundo?

Aquelas pequenas anémonas verdes parecem delicadas flores, levam uma vida de paz esperam tranquilamente que as presas passem ao alcance de seus tentáculos, não será mais feliz que um qualquer executivo que trabalhando de manhã à noite acumula uma riqueza que no fim da vida de nada lhe servirá?

sábado, 21 de fevereiro de 2009

Finalmente...

musica: Break the Chain - Gene Loves Jezebel
A corrente era forte, muito forte. Nadei contra ela até que por fim, exausto, tive de me agarrar ao fundo. As anémonas eram violentamente agitadas pela força da água, algas passavam por mim a grande velocidade.

Uns metros à frente vejo que as rochas formam uma protecção da corrente, espero que esta amaine e lanço-me na sua direcção. Finalmente consigo um abrigo para descansar um pouco. Normalmente não nado contra a corrente, mas hoje era necessário, não havia nada a fazer tinha de ir naquela direcção.

Ali abrigado os pensamentos fluem, vou ordenando a minha mente enquanto tento recuperar o fôlego.

Um polvo observa-me atentamente interrogando-se que faria ali aquele ser desajeitado. Pensa que só mesmo um humano para ser assim tão pateta a nadar contra a corrente, ainda por cima carregado de adereços.

De facto nós os Homens somos os únicos animais que lutam contra a natureza, todos os outros adaptam-se e fluem com ela. Nós não achamos que podemos controlá-la, domesticá-la... Pura ilusão, a natureza é bem mais forte e se continuamos a agir desta forma ela acabará por se virar contra nós.
Com estes pensamentos saio tentando alcançar um novo abrigo, cheguei lá e observo que há minha volta existe uma profunda Paz, em contraste com a minha respiração ofegante, os diferentes peixes observam-me algo espantados pela minha persistência em vencer uma corrente que é mais forte que eu.

Tento acalmar a respiração e descansar ao máximo para tentar novo trajecto, vou deixando-me contagiar pela harmonia que reina neste mundo de imponderabilidade. Aqui não há pressas, stress, ansiedade. Paz! Uma profunda Paz invade-me.
Olho para o computador, este indica que já gastei metade do ar da garrafa, mas ainda não atingi o meu objectivo, como conseguirei voltar? Será que quero voltar? Não será melhor ficar aqui? Deixar-me levar por esta tranquilidade e não mais voltar à superfície?

A ideia é tentadora, de repente atingir o objectivo deixou de interessar, só a harmonia que me rodeia interessa, a minha respiração abranda rapidamente. A Paz invade-me, toma conta de mim. Já nada mais me interessa, vou ficar aqui, já não volto!

Um caboz aproxima-se e diz-me que talvez não seja muito inteligente aquilo que estou decidido a fazer. Respondo-lhe que sinto-me em Paz e é assim que quero ficar. O caboz sacode a cauda e levanta a barbatana -És um parvo! Para quê que vais abandonar tudo? Achas que aqui em baixo há Paz? Não! A Paz que sentes é aquela que trazes dentro de ti, só que enquanto estás à superfície não a sentes pois tens outros objectivos. Já esqueceste que ainda não há muito tempo debatias-te para vencer a corrente, achas que estavas em Paz nessa altura?

-Não. De facto não estava em Paz e és capaz e ter razão, ela deve estar mesmo dentro de mim.
Olho para o computador, já passaram 38 minutos de mergulho, tenho ar para apenas 5. Não vou conseguir voltar ao barco, tenho de subir e depois nadar quase 1 Km à superfície.

Subo até aos 5 metros e faço a paragem de segurança de 3 minutos. Deixo-me fluir com a natureza, estou em plena Paz e harmonia com tudo o que me rodeia, a minha respiração está calma, sinto perfeitamente tranquilo.

A corrente arrasta-me docemente, deixo-me levar, acabou o tempo do patamar de segurança, vou subir.

Surpresa! Ali na minha frente está o cabo da ancora do barco, agarro-o e subo por ele. Já há superfície deixo-me levar pela corrente até à popa e com calma subo para bordo.

Lição aprendida!

terça-feira, 27 de janeiro de 2009

Fantasmas

música: Angels - Robbie Williams

Hoje sonhei com fantasmas, sonhei que estava no fundo do mar, e no meio da escuridão e da suspensão os tinha visto, turvos como se no meio de um nevoeiro se escondessem.

Havia uma neblina verde, um ambiente lúgubre, no entanto sereno, voltei a ver os fantasmas, passaram ali ao lado, seriam de marinheiros ou de piratas? seriam de exploradores ou curiosos?

Que interessa o que eram? Apenas são fantasmas, sombras de uma vida passada, relâmpagos de uma vida que há-de vir. Um pesadelo? Não! Do mar não vêm pesadelos. Um sonho? Talvez! Pois é no mar que nascem os sonhos.

Será apenas o reflexo de um farol? E se for um farol fantasma? Há navios fantasmas, porque não há-de haver também faróis?
Eram peixes, provavelmente, pois aqui é o seu reino, mas também é de Nereu, Poseidon, das ninfas, das sereias e dos tritões.

Este também é o seu reino, este é o meu reino, serei eu um fantasma? Estarei aprisionado num limbo do qual me liberto aqui neste mundo imponderável, onde a beleza impera e onde podemos sentir a PAZ, o AMOR e a SERENIDADE

Aqui ouço o canto dos anjos, aqui sou verdadeiramente feliz, liberto da dor da gravidade, posso voar, rodopiar, aqui livre das grilhetas do ódio e da inveja partilho a minha alegria com todos os seres que me rodeiam.

Descobri que os peixes são na realidade anjos, que em vez de asas têm barbatanas, que o AMOR é infinito e que a PAZ é eterna.

sábado, 10 de janeiro de 2009

Eu me perdi

música: Lost? - Coldplay
As ondas desfazem-se na areia elaborando uma pintura surreal com a sua espuma branca e cantando uma melodia de amor em tons graves. O vento acaricia-as deixando atrás uma nuvem de água. Um pequeno barco aproxima-se traçando uma linha branca no azul profundo do mar, vem vazio, nem as gaivotas se importunam a visitá-lo. Aqui e ali uma gaivota passa a rasar as águas, 2 surfistas baloiçam nas ondas, apesar do frio intenso que se faz sentir sinto-me tentado a ir também para lá. A minha mente recua no tempo nostalgicamente.

São 10 horas do dia 3 de Janeiro de 2009 em Sesimbra. Dirijo-me para o barco. Subitamente começa a chover apesar de ter estado um dia de sol; cumprimento a chuva, é a antecipação da entrada nos domínios de Poseidon, um aperitivo. Entramos na água, está turva, muito turva, vê-se pouco mais de 5 metros. Descemos felizes apenas por ali estarmos, um cardume de sargos surge no meio da suspensão como se fossem fantasmas no nevoeiro de um cais assombrado.

Um bodião vem acompanhar-me e conduz-me até uma bela esponja amarela contando-me que já foram conhecidas pelo ouro do mar. Na penumbra admiro-a, admiro o silencio que me rodeia, a imobilidade, o ser e o não ser daquela criatura tão estranha e ao mesmo tempo tão familiar.

Sigo-o pelo fundo do mar e por entre algas e medusas acabo por vislumbrar uma magnífica gorgónia. Contemplo um a um os seus frágeis braços de uma bela filigrana.
Perco-me por entre aquelas hastes ondulantes na corrente, sinto-me integrado naquele mundo, naquela beleza, naquela serenidade.

Mais abaixo vejo um caranguejo que tenta desesperadamente esconder-se da luz que é projectada pela minha lanterna, fico ali uns momentos e tento convencê-lo que não estou ali para lhe fazer mal. Agradecido, deixa-se fotografar, a calma volta a invadir o fundo do mar, os bodiões, as judias, os sargos, passeiam à minha volta naquela atmosfera quase fantasmagórica.

Poisam-me um café ao lado, despertando-me desta viagem ao passado. O cheiro dele associa-se à maresia e deixa-me inebriado, junto-lhe um pau de canela, os cheiros acentuam-se, não resisto mais e bebo-o com prazer.

Volto a contemplar o mar, as ondas continuam a desfazer-se preguiçosamente na areia.
O pequeno barco já desapareceu, os 2 surfistas continuam ali embalados pelas vagas e eu sinto-me em paz, feliz por ali estar, por desfrutar aquele momento. Rezo uma oração de agradecimento a todos os deuses que a humanidade já honrou, à natureza, ao Universo, na forma de um poema de Sophia de Melo Breyner:

Eu me perdi

Eu me perdi na sordidez de um mundo
Onde era preciso ser
Polícia agiota fariseu
Ou cocote

Eu me perdi na sordidez do mundo
Eu me salvei na limpidez da terra

Eu me busquei no vento e me encontrei no mar
E nunca
Um navio da costa se afastou
Sem me levar



Não se percam no Lado Escuro da Lua!